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Foto do escritorManuel Rosa de Almeida

A DOÇURA DO BRASIL

Um poema de Manuel Rosa de Almeida sobre o que-não-deve-ser-nominado.



Oh, tu, ser arrogante, que conspurca tudo!

É possível que a dureza de teu coração

Seja tal que contamine o que de mais possa haver

Em ti: pensamento, doçura, emoção?


Em dois meses morreram milhares

E fostes incapaz de uma só mensagem

De carinho, de consolo, de alento…

Aos patriotas que em seus lares

Sofreram da perda o tormento

Dos amados que seguiram viagem…


Em dois meses a nação dilacerada

Precisa de norte, de doce liderança

Mas a busca encontrou o arrivista

Que debocha, minimiza, degrada,

Que visando a si mesmo, egoísta

Consome as chamas da esperança.


Oh, tu, ser conspurcado, que te arrogas tudo!

É possível que de teu pensamento a frieza

Seja tal que contamine o que de mais possa haver

Em ti: coração, doçura, nobreza?


Para tristeza da pátria, tens sido

Como Nero em tempos antigos

Cercado de lisonjas e tolos risos

Como Dom Pedro I, tens sido,

Cercado de áulicos, não amigos

Coberto da vaidade por seus guizos.


Para tristeza da pátria, professas

Liturgias de ódio. A violência obra

Acres e torpes cantilenas

E nossas crianças, às centenas

Recitam um rosário às avessas

Em que cada conta uma morte cobra.


Oh, tu, duro ser que sequer pensas

É possível que este imenso vazio

Quem em ti a tudo contamina

Consuma a doçura do Brasil?


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