A língua portuguesa tem pérolas esquecidas, espalhadas em velhos livros já não lidos. Hoje mergulhamos no Século XVII para rememorar um poeta esquecido e maldito: Gregório de Matos. Para quem acha que Gregório de Matos compunha apenas poemas satíricos e licenciosos, um poema de inspiração religiosa que é humilde e contrito colocar-se aos pés do Todo Poderoso.
Imagem de Gerd Altmann por Pixabay
A JESUS CRISTO NOSSO SENHOR
Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque, quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido;
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida e já cobrada
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra história,
Eu sou, senhor, a ovelha desgarrada,
Cobrai-a; e não queirais, pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
Gregório de Matos nasceu em Salvador em 1623 e aí viveu a maior parte de seus anos até morrer em 1696. Advogado e poeta barroco, escritor satírico, por sua língua ferina foi cognominado "O Boca do Inferno". A ele se atribuem inúmeros poemas licenciosos. Embora filho de fidalgos, morreu na miséria.
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