Crítica de cinema
O apavorante caminho das pedras que leva à tirania…
Imagem de Clker-Free-Vector-Images por Pixabay
A recomendação foi de minha esposa, que por sua vez a recebeu do ator Alexandre Nero. Ela, ciente da minha preocupação com a preservação de nossa frágil democracia. Alexandre Nero ( ele mesmo, com um nome de dois tiranos ) recomendando que as pessoas entendam como as coisas ocorrem e… estão ocorrendo.
Trata-se de uma série da Netflix, em seis curtos capítulos ( 30 minutos cada ), onde se explicitam os passos que todo potencial candidato a tirano deve seguir. Baseia-se fundamentalmente na análise documental do caminho percorrido por seis terríveis tiranos, a saber: Hitler, Saddam Hussein, Idi Amin Dada, Stalin, Muammaral-Gaddafi e a dinastia Kim. Nesta ordem, analisa-se como dominaram - temporária ou definitivamente - seus países, no caso a Alemanha, Iraque, Uganda, União Soviética, Argélia e Coreia do Norte. Por vezes, Mussolini e Pol Pot também são citados.
Os passos são sempre os mesmos, hipoteticamente presentes no “Manual do Tirano”. Canalizar a insatisfação generalizada contra um inimigo ( real ou inventado ), verbalizar a insatisfação destas pessoas por meio de um movimento radical, aproveitar as oportunidades que sempre se oferecem aos tiranos… Uma vez no poder, anular os sistemas de controle, notadamente Legislativo, Judiciário e Imprensa Livre.
A trilha do tirano segue pela perseguição de adversários ( com assassinatos ou prisões ), alteração da lei vigente, criação de uma imagem de salvador da pátria, domínio absoluto dos meios de comunicação. As garras se fecham em torno das liberdades públicas, das instituições, das próprias pessoas, até se atingir o domínio total de mentes e corpos, como estabeleceu a dinastia Kim na Coreia do Norte.
Meses atrás recomendamos a leitura do livro “Como as Democracias Morrem”. Os trabalhos se assemelham, embora o livro seja mais profundo. De qualquer modo, ambos acentuam que o verdadeiro terror é constatar que qualquer um pode ser um tirano. Nenhum dos seis tiranos apresentados possuíam qualidades extraordinárias. Pelo contrário, eram, em muitos sentidos, medíocres, fracassados. Os ingredientes necessários para ser um tirano são de outra natureza. Essencial mesmo é ser narcisista, insensível e tranquilamente disposto a causar dor e morte a muitas pessoas.
A série mostra-se extremamente recomendada ao Brasil do presente. Simplesmente porque Bolsonaro está seguindo o manual do tirano à risca. Ele já canalizou a raiva de parcela da população contra a esquerda em geral, contra comunistas, gays, mulheres e jornalistas. Ele já investiu contra a imprensa livre. Ele está aparelhando o Estado. Ele já premiou as forças armadas. Ele ja depreciou as instituições basilares da democracia. Os passos estão sendo dados, meticulosamente. E sim… Bolsonaro é medíocre. Mas para ser tirano, isso pouco importa.
Como se Tornar um Tirano - Netflix, 2021.
Gênero: Documentário.
Narração: Peter Dinklage - um charme especial para a série.
Avaliação: Nota 8
Recomendação: Para todos que não querem negar a verdade ou esconder a cabeça num buraco.
Adjetivos: Necessário, alarmante.
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