A proposta de Ricardo Barros é mais um balão de ensaio do governo Bolsonaro em sua busca de perpetuar-se no poder.
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A Constituição da República Federativa do Brasil é de 1988. Para quem não lembra, a Nova República data de 1985. Vale dizer que havíamos dado adeus à ditadura militar e, para estabelecer os marcos legais do novo regime, instaurado uma Assembleia Nacional Constituinte. A nova Constituição era, portanto, uma necessidade do momento.
Tivemos problemas no processo, naturalmente. O ideal é que a Assembleia Constituinte fosse formada unicamente para trazer a lume a nova Carta, que não fosse, como foi, congressual. Isso acarretou alguns defeitos, sobretudo o particularismo, que redundou num texto extremamente longo e com dispositivos mais adequados para a legislação complementar. Mas, de qualquer modo, nós temos uma das constituições mais respeitadas do mundo, sobretudo no que toca aos direitos e garantias individuais. Não é à toa que a chamam de Constituição Cidadã. Também não é sem razão que países em processo constituinte, estudem nossa Carta Magna para absorver seus pontos positivos.
Ao longo de seus 32 anos, a Constituição Federal já recebeu mais de 100 emendas, o que denota seu contínuo aprimoramento, bem como uma real possibilidade de melhoria por meio do processo de emendas. Então, foi com imensa surpresa que a comunidade jurídica recebeu a intervenção do líder do governo Bolsonaro, deputado Ricardo Barros, defendendo uma Assembleia Nacional Constituinte para o ano que vem.
Ricardo Barros é um político experiente, aquele político que no passado receberia a alcunha de raposa. Não é crível, pois, que tenha agido por mero impulso, já que participava de um evento sobre Direito Constitucional. Também não se pode acreditar que tenha lançado esta proposta que, a se concretizar, traria consequências imensas para o país, sem o aval do Presidente Bolsonaro.
Então fica a pergunta do título: a quem interessa uma nova Constituição? Qualquer raciocínio isento responde: aos autoritários. Uma Assembleia Nacional Constituinte é o que se chama de tabula rasa, vale dizer, limpa-se a lousa do mundo jurídico de um país para reescrevê-lo a partir de suas normas fundamentais. Está implicado aí muito PODER. Naturalmente, é uma grande oportunidade para o país, mas também envolve grandes riscos. Por isso uma Assembleia Nacional Constituinte é reservada para momentos-chave, como a superação de um período de ditadura, por exemplo.
Ciente dos riscos, países que já tem uma boa constituição, não se lançam em tal aventura. A Constituição dos Estados Unidos, por exemplo, tem mais de duzentos anos. Alguém acha que algum político americano teria coragem de sugerir uma Assembleia Nacional Constituinte? Como dissemos, os riscos são imensos, em especial de possibilitar campo para ditaduras institucionalizadas. Imaginem que a constituinte reduzisse os poderes do Ministério Público… Imaginem que a constituinte facultasse um terceiro mandato ao Presidente da República ou pior, vários mandatos… Imaginem que a Constituinte mudasse a composição do Supremo Tribunal Federal para, digamos, 15 Ministros. Bolsonaro ganharia a indicação de mais quatro Ministros do STF, obtendo virtual controle sobre a Suprema Corte.
Tudo isso poderia ocorrer se a composição da Assembleia Constituinte fosse, por força das mídias sociais e de fake news, conservadora e autoritária. Felizmente, as reações foram fortes e vieram de diversos pontos. Houve muitas e intensas reações porque ninguém é ingênuo. Se a proposta veio de Ricardo Barros, veio do Planalto. Trata-se, assim, de mais um balão de ensaio dos bolsonaristas, na busca de seu ideal autoritário e ditatorial. Somente a eles interessa uma Assembleia Nacional Constituinte neste atual quadro.
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