O que foi, afinal, o governo Bolsonaro?
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Dizem que o brasileiro tem memória curta. Agora, na perspectiva de uma eleição presidencial, a falta de memória é problema sério que traz graves consequências. Para refrescar lembranças do que foi a gestão de Jair Bolsonaro, passamos a republicar - todo domingo - comentários sobre este governo.
Assim, você poderá avaliar toda a trajetória deste governo ( ou desgoverno ). Quando outubro chegar, com os fatos recolocados, você pode formar seu julgamento. E se quiser reconduzir Jair Bolsonaro ao poder, é decisão e responsabilidade sua.
Continuamos com a série de republicações das impressões colhidas sobre o governo Bolsonaro. Hoje lembramos dos primeiros lances jogados por Bolsonaro em sua busca - bem sucedida, diga-se de passagem - de aparelhar o Estado. Daquele início até agora a situação agravou-se muito e o alerta final da matéria é mais atual do que nunca.
APARELHAMENTO DO ESTADO - Texto originalmente publicado em 14.07.20
Três casos evidentes de aparelhamento do Estado pelo governo federal.
Um dos mais fortes sinais de que está havendo uma investida contra a democracia é o chamado aparelhamento do Estado. Esta expressão busca exprimir a busca pelo domínio das instituições de Estado e sua conversão em instrumentos a serviço do governo. As instituições de Estado transformam-se em instituições de governo; não perseguem mais o interesse público, mas o interesse do grupo que está aferrado ao poder.
O aparelhamento do Estado pode se dar de várias formas, desde a indicação de pessoas subservientes ao governo, até a mudança das regras que regem as instituições. No Brasil estamos, neste exato momento, presenciando a tentativa de aparelhar o Estado em favor dos interesses do clã Bolsonaro. Há três exemplos evidentes disso:
Advocacia Geral da União - No último sábado a AGU protocolou medida perante o Supremo Tribunal Federal, buscando reverter o bloqueio de contas de apoiadores de Bolsonaro no facebook e twitter, determinada pelo Ministro Alexandre de Moraes. Como se sabe, são contas de blogueiros, empresários e políticos ( Roberto Jefferson, Luciano Hang e outras figurinhas carimbadas ), todos envolvidos no processo que trata das fake news. Ora, é possível discutir a validade da decisão e seu alcance face o princípio constitucional da liberdade de expressão, ninguém duvida disso. Mas mostra-se totalmente despropositado que a AGU faça isso. Afinal, onde há o interesse de Estado? Se o mote fosse a defesa do princípio da liberdade de expressão, a prerrogativa de ação caberia ao Ministério Público e aos próprios atingidos, jamais à AGU. Quando a AGU sujeita-se a cumprir um trabalho que não é seu, apenas para agradar ao chefe de plantão, é caso típico de aparelhamento do Estado.
Ministério da Justiça - Em outro exemplo de aparelhamento do Estado, o Ministério da Justiça, por intermédio da Secretaria de Operações Integradas ( SEOPI ), vem monitorando mais de quinhentos servidores, provavelmente para assegurar seu comportamento pela cartilha bolsonarista. São policiais, delegados de polícia, secretários de segurança pública ou de direitos humanos e professores universitários. O monitoramento se dá porque estes servidores estariam, de alguma forma, ligados ao movimento antifascista. O objetivo de tal monitoramento parece óbvio: afastar de qualquer cargo relevante servidores federais ou estaduais ( estes mediante a influência do governo federal em alguns estados federados ) que não se coadunem com os valores e intenções do governo Bolsonaro. Trata-se de evidente aparelhamento do Estado que atenta contra a liberdade de pensamento, expressão e associação de todos estes servidores. O caso é grave ao ponto de já estar sendo investigado pelo Ministério Público Federal.
Ministério Público Federal - O caso mais grave de aparelhamento do Estado, contudo, está no Ministério Público Federal. Começou com Bolsonaro negando-se a seguir a saudável tradição de nomear alguém da lista tríplice, eleita pelos pares, após debates e apresentação de suas propostas. Foi assim que Augusto Aras chegou ao poder. Após alguns ensaios de medidas que mostram alinhamento ao governo federal ( o que para a Procuradoria Geral da República é como alho para vampiros ), Aras agora investe contra a Lava Jato, notadamente contra os núcleos de Curitiba e São Paulo. Inúmeras vezes fiz críticas à Lava Jato, sobretudo pela exposição precoce de pessoas meramente investigadas, bem como pelo rompimento de regras processuais elementares ou desrespeito aos direitos e garantias individuais. Entretanto, é indiscutível o papel relevante da Lava Jato no combate à corrupção. Quando o Procurador Geral da República se pronuncia em live contra a operação, apontando mazelas e usando termos típicos de quem se opõe a ela ( como lavajatismo, por exemplo ) está a serviço de quem se opõe ao combate à corrupção, justamente num momento em que as investigações contra o clã Bolsonaro estão em evidência. Um procedimento correto teria evitado os holofotes, buscando coibir abusos internamente, pelo diálogo ou pela ação de sua Corregedoria. Aras, entretanto, já anunciou que pretende pulverizar as ações da Lava Jato por toda a instituição. Por outra, quer dizer, retirar-lhe a relevância, conferir-lhe status de rotina, o que implica em claro retrocesso. Caso escrachado e vergonhoso de aparelhamento do Estado.
Aos brasileiros recomendamos o de sempre: cautela, vigilância, prontidão. É preciso denunciar, da maneira possível, todos desmandos autoritários deste governo. Denunciar enquanto é tempo...
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