As trapalhadas do primeiro escalão e do próprio Bolsonaro no mês de janeiro constituem sintomas de problemas bem mais profundos que precisam, quanto antes, ser diagnosticados.
Imagem de Clker-Free-Vector-Images por Pixabay
* 17/01/20 - Sintoma - Depois de gravar um vídeo pretensamente promocional ao lançamento de um grande Prêmio Nacional de Cultura, o Secretário Nacional da Cultura, Roberto Alvim, é demitido por Bolsonaro. No vídeo, com estudado cuidado, procurou-se reproduzir ambientação e texto de um discurso de Joseph Goebbels, ministro nazista da propaganda de Hitler. Alvim chegou a plagiar, descaradamente, as palavras de Goebbels. O Presidente, a princípio, minimizou o caso, somente tomando uma medida enérgica quando pressionado pela
comunidade judaica.
Diagnóstico - O autoritarismo está arraigado entre membros do alto escalão do governo, a começar, como é evidente, pelo próprio Bolsonaro. Um dia antes o Presidente havia elogiado Roberto Alvim em uma cerimônia pública, chamando-o de “melhor Secretário da Cultura em décadas”. Não é crível que Alvim levasse a público o vídeo - com clara conotação fascista - se não se sentisse respaldado pelo próprio Bolsonaro.
* 23/01/20 - Sintoma - O Presidente ameaça recriar o Ministério da Segurança, retirando-o da alçada de Moro. A medida, na prática, retira poderes do Superministro, subtraindo-lhe o controle da Polícia Federal. Pouco depois, Bolsonaro voltou atrás.
Diagnóstico - Aqui o problema é bem mais fundo, subterrâneo, envolve jogo de vaidades e luta por poder. Bolsonaro já identificou em Moro um perigo real às suas pretensões de reeleição. Moro percebeu nos primeiros dias de governo que pisava terreno arenoso e que todas promessas recebidas tinham um preço. Os dois estão empenhados em surda queda de braço desde o princípio do governo. É possível que Bolsonaro remova o problema da maneira mais simples: indicando Sérgio Moro para o Supremo Tribunal Federal, na vaga de Celso de Mello.
* 30/01/20 - Sintoma - José Vicente Santini, o segundo na hierarquia da Casa Civil, foi sumariamente demitido por Bolsonaro. Motivo: viagens milionárias no jatinho da FAB - a serviço - para Suíça e Índia. Pouco depois, Santini é nomeado para um cargo de assessor na Casa Civil, quase com o mesmo salário. E, logo em seguida, novamente exonerado pelo Presidente.
Diagnóstico - Confusão, destempero, precipitação. O erro cometido por Santini segue rigorosamente a cartilha do governo federal. Como Ministro interino da Casa Civil ele seguiu o procedimento de todos os demais Ministros, alguns com mais de cem voos só em 2019. O procedimento é ruim e oneroso aos cofres públicos, deixemos claro, mas não foi inaugurado por Santini. Ele simplesmente sentiu-se autorizado pelo comportamento normal do primeiro escalão. Aí manifesta-se o destempero do Presidente, que discursa sem saber de todos os fatos e age sem pensar. Santini exonerado, os filhos vêm pedir por ele ( afinal, é um parça ). Bolsonaro, como sempre ocorre quando os filhos estão envolvidos, cede precipitadamente e Santini é nomeado para outro cargo na Casa Civil. A coisa toda ganha contornos ridículos: exonera num dia, nomeia no outro. Afinal, houve ou não falta? Aconselhado pelos Generais mais antigos, quiçá uma reserva de algum bom senso, finalmente Bolsonaro parece entender quão injustificável era seu comportamento e não resta outra alternativa: Santini vai pra rua novamente. O que se percebe é um governo sem valores claros, que se perde em questões menores, que age sempre fora do tempo e vê-se forçado a rever seus atos e declarações. Enfim, bagunça, confusão.
Comments