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Foto do escritorHatsuo Fukuda

INTERVALO MUSICAL



Um evento de perguntas e respostas de Trump se transformou em uma reveladora sessão musical.


Imagem de Exame.



Um evento típico de campanha eleitoral nos Estados Unidos é a Town Hall, onde o candidato se reúne com eleitores para responder perguntas. Em tese, qualquer eleitor pode participar, mas na prática as campanhas organizam eventos para plateias amigáveis, para que o candidato responda perguntas amigáveis.


Trump estava fazendo uma town hall em Oaks, Pennsylvania, quando um participante desmaiou. A equipe médica atendeu, rapidamente. Trump mandou tocar Ave Maria, de Gounod. Um clássico. O evento prosseguiu, e em seguida houve outro desmaio na plateia. Mais Ave Maria. A moderadora, a governadora Kristi Noem, de South Dakota, estava reiniciando o evento, mas Trump resolveu ouvir música. “Vamos parar com as perguntas. Vamos apenas ouvir música. Quem está interessado nas perguntas, afinal?” O espetáculo – trata-se de um espetáculo – prosseguiu por mais 40 minutos com Trump e a governadora no palco enquanto a playlist de Trump rodava, de improviso. (Um assessor nos bastidores escreveu rapidamente uma lista das preferidas de Trump.) Desta vez Trump pediu Ave Maria na versão de Pavarotti.


Algumas músicas tocadas: It’s a Man’s Man’s World, de James Brown, An American Trilogy, de Elvis Presley, Nothing Compares 2 U, de Sinead O’Connor. Trump saiu com November Rain (Guns N’ Roses) e Memory, do musical Cats.


Foi bizarro. A mídia e a campanha de Kamala destacaram o evento, perguntando-se se ele, aos 78 anos, estaria em condições físicas e mentais para ser presidente dos Estados Unidos. Kamala, com a gentileza (e o veneno) típico dos políticos tarimbados, postou uma mensagem: “Hope he’s okay”. Não tenham dúvidas. Kamala é uma cobra venenosa. Vai ser uma grande presidente. A mídia, inclusive o jornalão dos jornalões, New York Times, começou a publicar reportagens (além das colunas de opinião) questionando a integridade mental de Trump. A cada evento de Trump surgem mais demonstrações de comportamento incoerente e aparentemente randômico. Trump alega que seus discursos, onde não há um fio condutor e um assunto leva a outros assuntos não relacionados – denotando o que seria, em qualquer pessoa, um sinal de confusão mental – são uma tessitura mental (the weave) e um sinal de gênio oratório. “Eu falo sobre nove diferentes coisas e elas todas voltam brilhantemente juntas. Como disse um amigo meu, professor de Inglês, é a coisa mais brilhante que eu já vi”. Trump não é um homem modesto, e essa descrição, bem, é uma mentira deslavada. As falas dele são as de um doido varrido.


Nossos leitores sabem que as campanhas são espetáculos midiáticos. A de Kamala Harris é um megashow, onde todos os eventos são cuidadosamente planejados e os discursos e a plateia – que fazem parte do espetáculo – são organizados com objetivos previamente calculados. A atriz principal – leading lady – Kamala, nunca abandona o script, inteiramente voltada para a público que pretende atingir: jovens, negros, empreendedores, mulheres, republicanos moderados, latinos, caipiras brancos do Sul, etc. A campanha de Donald Trump se diferencia de Kamala (e de todas as outras anteriores) neste aspecto. Trump é um one man show. Ele é o espetáculo. Tudo gira em torno dele e suas idiossincrasias. Assim ele conquistou o eleitorado MAGA e o Partido Republicano e assim ele dobrou os antigos chefões republicanos às suas vontades.


Kamala está entregando um grande espetáculo da Broadway e Trump uma stand up comedy sinistra e sem redator. O sucesso é garantido para ambos. As plateias vêem o que querem ver.


Quanto ao intervalo musical, creio que o instinto de Trump, sempre conectado com as plateias, percebeu instantaneamente que, após dois desmaios, não havia clima para o espetáculo. Imediatamente, como bom show man, reverteu para a festa musical. Meio estranho, mas os desmaios aparentemente tiveram origem no calor do ambiente, sem ar condicionado. Plateias envelhecidas, mais suscetíveis ao calor. E se houvesse outro desmaio? Melhor ouvir música. Ponto para Trump.


Faltam 14 dias para a eleição, em 5 de novembro. As eleições pelo correio já começaram em quase todos os Estados. Não percam aqui, no Dialéticos, toda terça-feira. O Grande Circo Americano vai pegar fogo.



A playlist das preferidas de Trump (a mídia não deu todas) são grandes clássicos. Você pode ouvi-las em Spotify, Apple Music, Youtube, etc. Vale a pena. Mas encerrar com Guns N’Roses cantando “Nothing last Forever/And we both know Hearts can change/And it’ hard to hold a candle/In the cold November rain” não soa como um mau presságio para quem espera um feliz 5 de Novembro? E Memory, o grande clássico da Broadway? É uma das mais belas canções já escritas, e é uma canção sobre a redenção, mas basicamente fala das glórias do passado e o anseio de recuperar aquilo que foi perdido. É bela, mas é triste. Muito triste.

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