Forquilhinha, a terra do Cardeal Arns, de Zilda Arns e da cerveja Coruja. Herminio Back explica
- HERMINIO BACK
- 9 de out.
- 4 min de leitura
Herminio Back

A médica Zilda Arns, uma quase beata e santa; Dom Paulo Evaristo Arns, o cardeal arcebispo que defendeu a liberdade no Brasil; o cardeal Leonardo Steiner, de Manaus; o professor e lingüista Eurico Back; a cerveja Coruja, todos têm algo em comum: beberam nas águas de Forquilhinha, uma pequena cidade do Sul de Santa Catarina. Leia o artigo de Hermínio Back para entender o mistério.
O que pode explicar o fato de que um pequeno município do Sul catarinense tenha gerado tantas figuras importantes na história nacional? De fato, das coivaras de antigamente, das casinhas coloniais da metade do Século XX, alguns berços de madeira acolheram figuras de proa em vários campos no Brasil.
O município a que me refiro é Forquilhinha, um nome meio acaipirado que se refere à junção de dois rios, o São Bento e o Mãe Luzia. Este acolhe as águas daquele e corta Forquilhinha bem ao centro da cidade. Ali da ponte velha do Mãe Luzia meu pai dizia que podia divisar cardumes de peixes nadando nas águas rápidas. Hoje, morreram os peixes, morreu meu pai e também morreram as figuras de proa a que me refiro, exceto uma.
Cito quatro dessas figuras, apenas. A primeira é o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, Doutor pela Sorbonne, mas conhecido mesmo pela luta contra a ditadura em seus piores anos. Onde muitos se recolheram, D. Paulo foi a voz de uma Igreja que denuncia e acolhe os oprimidos. Consta que quase foi Papa, quando os cardeais se reuniram para escolher o sucessor de João Paulo I. Venceu Carol Wojtjla, o primeiro papa polonês que comandou a Igreja sob o nome de João Paulo II.

Cito também Zilda Arns, cotada algumas vezes para o Prêmio Nobel da Paz por seu trabalho à frente da Pastoral da Criança e que está em processo de beatificação pela Igreja Católica, o primeiro passo para a santificação. Trata-se de uma grande instituição de ação social, ligada à CNBB, que foca na formação de líderes e no trabalho voluntário para cumprir importantes ações de saúde e educação. Estas lideranças trabalham na conscientização das famílias para o desenvolvimento integral das crianças na faixa de zero a seis anos. No que toca à nutrição da primeira infância, a Pastoral da Criança conseguiu resultados espantosos. Seu falecimento no terremoto no Haiti, causou comoção mundial.

Falo também do meu pai, Eurico Back, um gramático reconhecido internacionalmente e respeitadíssimo no país. Deixou um trabalho impressionante tratando da Língua Portuguesa e da formação estudantil em Português, além da Gramática Construtural, uma proposta que, por ser um tanto revolucionária, nunca foi totalmente compreendida pelo meio acadêmico.

Recentemente, surgiu a figura de Leonardo Ulrich Steiner, também ligado à Igreja católica. Foi duas vezes secretário-geral da CNBB e tornou-se Cardeal em 2022, nomeado pelo Papa Francisco. Na escolha do Papa Leão XIV, seu nome também foi citado como uma das possibilidades.
Todas essas figuras são de descendência alemã e ligadas à Igreja Católica, de modo que se costuma apontar essas como as razões de tanto destaque às figuras de Forquilhinha. Sem dúvida, é o principal aspecto a se considerar, mas existem outros.

Há quem aponte para a economia. Conquanto de pequena população, Forquilhinha é um município rico. A economia local está lastreada nas minas de carvão, no grande frigorífico - JBS -, nas agroindústria, além, naturalmente, da agricultura, onde se destaca a cultura do arroz, milho e a produção de leite. A energia vem da Coopera, a cooperativa local de distribuição de energia, uma verdadeira potência, cuja eleição do Diretor-Presidente parelha com a eleição municipal em importância e acirramento.

A economia é forte, de fato, mas há quem aponte a educação como o fator de destaque. No passado, meu avô, Adolfo Back, ao lado de Jacob Arns, comandaram um colégio famoso pela excelência - a União Escolar de Forquilhinha, uma escola comunitária -, formando muita gente famosa, inclusive Dom Paulo Evaristo e Zilda Arns. Depois o ensino ficou por conta do Colégio das Irmãs Escolares de Nossa Senhora, que hoje competem com a educação pública.

Finalmente, nas mesas das grandes festas locais*, há ainda quem defenda a cerveja. Para muitos, tudo está relacionado aquela água que passarinho não bebe. Verdade seja dita, a cervejaria local - Saint Bier - já produziu a cerveja dos Simpsons. Hoje a Cervejaria Santa Catarina (que controla a Saint Bier) produz todos tipos de cerveja, da pilsen à stout, com destaque para a Coruja, já mencionada aqui em artigo de Hatsuo Fukuda, um conhecedor do assunto.
Seja a cerveja, seja a educação ou a ascendência germânica, fato é que Forquilhinha é um mistério. De que espécie de energia vem a formação de tantas lideranças respeitáveis no panorama nacional? Há quem se poste sobre a ponte do Mãe Luzia e, perscrutando as águas mortas, busque no marulho das águas e na brisa litorânea uma resposta sussurrada. Em vão...

A principal festa local é hoje a Heimatfest, normalmente marcada para abril. Ela é a sucessora da antiga festa do colono, que misturava a cultura alemã e italiana em homenagem aos frutos da terra e àqueles que calejavam mãos para produzir riqueza.

Herminio Back, advogado e Procurador do Estado do Paraná, é um orgulhoso forquilhinhense de coração.









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