Um poema de Manuel Rosa de Almeida sobre o medo.

Imagem de Stefan Keller por Pixabay
De tudo tens medo…
Medo de chegar cedo
Medo de chegar tarde
De apontarem o dedo
Medo de qualquer alarde.
De tudo tens medo…
Tens medos infantis
Medos compreensíveis
De coisas possíveis
E de ameaças pueris.
Ah, se soubesses, amor
Apenas um dia sem medo
Vale vinte anos de pavor.
De tudo tens medo…
Tens medo de falhar
Tens medo de perdê-la
Tens medo de amar
E até de protegê-la.
De tudo tens medo…
Irmão, teu medo é tanto,
Que por inteiro te congela
E tua paralisia causa o pranto
E causa a distância dela.
Ah, se soubesses, criatura
Apenas uma hora sem medo
Vale um ano inteiro em paúra.
De tudo tens medo…
Tens medo do fracasso,
Tens medo da pobreza
Medo de dar um passo
Medo da natureza.
De tudo tens medo…
São teus medos de criança
Tão tolos quanto os de adulto
Vampiros, sombras, vultos,
Morte, solidão, doença…
Ah, se soubesses, compadre
Uma efêmera vida sem medo
Vale mais quer um eterno covarde.
De tudo tens medo…
Quisera em teu peito floresça
A chama do entendimento
Que parte do absoluto desapego
E da visão da ampulheta.
Levanta homem, cresça!
Tu não podes dar emprego
Ao teu mendigo, ao teu asceta
Sem mudar seu fundamento.
Em pé, irmão, segue avante!
Vive hoje, vive o presente
Não tenhas medo do futuro
Nem te alimentes do passado.
Teu medo está assentado
Em tudo que te faz inseguro
Despe-te das roupas imediatamente
E segue nu, pura e simplesmente.
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