A cada manifestação antidemocrática do Presidente, as instituições precisam fazer o contraponto...
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Lembro perfeitamente de uma conversa, décadas atrás, em que uma amiga narrava os dias finais do seu relacionamento, um casamento de seis anos. Ela disse que, pouco antes da decisão final pela separação, chamou o marido de “lixo humano”. Eu a censurei então, dizendo que nenhum ser humano devia ser xingado de lixo, porque é uma substantivação muito dura.
Tendo em vista os últimos acontecimentos, talvez eu deva reconsiderar esta opinião. Continuo pensando que nenhum ser humano deve ser chamado de lixo, mas as ideias de algumas pessoas certamente devem. Digo isso para, novamente, censurar o Presidente da República. Novamente Bolsonaro participa de manifestação antidemocrática, pugnando pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. Novamente, em meio a outras mensagens autoritárias, lá estava a faixa: Intervenção militar, com Bolsonaro. E novamente o Presidente da República sobe um degrau em sua escalada para uma ditadura em que ele seja o Führer, o Duce. Agora, além das bravatas rotineiras, afirma que o povo e as forças armadas estão com ele.
O povo certamente não. Todas as pesquisas apontam a queda de popularidade de Bolsonaro, sobretudo depois da defecção de Mandetta e Moro. Ele permanece com o percentual de 15% ou 20% em números decrescentes, representantes da ultradireita e outros muitos apenas leitores de fake news. Ontem na manifestação em frente ao Palácio do Planalto não havia mais que duas mil pessoas. Todos claramente cidadãos de classe média-alta e alta, que antes desfilaram em seus vistosos carros pela esplanada dos ministérios. Basta olhar as imagens da manifestação: rigorosamente não há povo ali. Há empresários e pessoas ricas que estão se lixando para o povo. Pessoas que, dentro de seus carros importados, ficam protestando pelo fim do isolamento, para que o povo se aglomere em lotações superlotadas.
Quanto aos militares, é preciso que se posicionem. Felizmente, o Vice-Presidente Hamilton Mourão, deu dura declaração contra a agressão sofrida por jornalistas durante a manifestação( fotógrafos receberam socos e chutes bem no dia da liberdade de imprensa, quão emblemático é isso ). Mas cabe ao alto comando das forças armadas reiterar sempre e uma vez mais que não estão dispostos a uma aventura autoritária. Sinceramente, não posso entender como generais de alto escalão sujeitariam-se a uma ditadura comandada por um capitão, que só não foi expulso do exército por uma concessão das altas patentes. Um capitão reformado cujo obscurantismo não tem nada a ver com os valores positivistas que sempre inspiraram o exército nacional.
Se nenhum ser humano merece ser chamado de lixo, Bolsonaro presume-se seja um ser humano, logo… Mas suas ideias - ditadura, violência, censura, preconceito - são lixo da pior espécie. É um lixo que não pode ser reciclado, pois pertence ao passado, um passado que pessoas de bem não querem reviver. Suas ideias são um lixo podre, fétido, orgânico, que somente serviria como adubo para o totalitarismo.
As pessoas de bem não podem fazer manifestações pela democracia, porque as pessoas de bem respeitam o isolamento social, estão preocupadas com uma pandemia que devora vidas pelo mundo inteiro, dizima a saúde pública e compromete a economia mundial. Aglomerações como as vistas neste domingo diante do Planalto, merecem todas as censuras do ponto de vista da saúde pública. Nelson Teich deveria fazer uma coletiva condenando acidamente o mau exemplo do Presidente da República e aceitar tranquilamente a exoneração que viria em seguida. Este cargo, afinal, está liquidando sua biografia. E não é possível trabalhar se quem o contrata sabota todas suas iniciativas.
Como as instituições não precisam sair às ruas para se manifestar, é preciso sempre fazer o contraponto às intenções explícitas do clã Bolsonaro. Congresso Nacional, STF, partidos políticos, associações de classe, sindicatos, todos devem repreender veementemente a participação de Bolsonaro nesta triste manifestação e focar na única solução possível: impeachment. E quando a pandemia finalmente passar e o povo possa voltar às ruas, que ocorram manifestações de rua pela democracia. E se alguns radicais de ultradireita surgirem gritando mito, mito, que a voz do povo passe por cima desta insanidade respondendo lixo! lixo!
dialeticos.com faz questão de usar a bandeira nacional em muitos textos políticos, sobretudo os assinados por Tião Maniqueu, para mostrar que os símbolos nacionais também podem ilustrar boas ideias, nestes dias em que, infelizmente, os símbolos nacionais e o verde-amarelo foram indevidamente apropriados por pregadores de ódio. Há mesmo pessoas sugerindo que as pessoas de bem usem a camisa azul da seleção brasileira, para não serem confundidas com o outro grupo.
dialeticos.com, dentro de sua proposta original, permanece aberto às manifestações de pessoas que desejam defender o comportamento do Presidente. Alguns representantes da direita foram convidados a fazê-lo mas, aparentemente, ninguém se sente confortável em assumir esta tarefa.
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