POSIÇÃO
- Melissa Zampronio

- 31 de mai.
- 2 min de leitura
Não é a primeira vez que desenho dores ...

Imagem de Geminni IA.
Revoltada com as horas que não passavam, segurando mal os demônios cá atrás dos meus olhos, passei de uma memória a outra, igual se faz com as músicas no celular. E de repente a hora se mexeu, e lá fora já não mais se via céu, dei-me conta de ter caído novamente naquele ritual meio tóxico de repassar as dores acumuladas. Achei-me presa na tentativa de dar um nome à angústia, em diferenciá-la da melancolia, e em acalmar a falta dela aqui dentro. Ainda não sei bem o que houve nem quais os motivos do abrupto distanciamento, mas está aí, vibrando bem alto nos meus nervos e denunciando a decisão de não mais compartilhar o amor comigo.
É incrivelmente complicado sentir a estrondosa rejeição e ainda querer entender por que dói tanto. E dói. Resta-me o filme congelado de tudo quanto dito, tudo quanto vivido entre nós e o modo como a vida parecia brilhar apenas por tê-la dividindo sorrisos comigo. E na tola intenção de não tumultuar aquela bela calmaria, talvez eu tenha me esquecido de acrescentar os clichês necessários, ou mesmo de lhe dar o tempo do silêncio de que todos precisamos - às vezes.
Pode ser também que eu tenha deixado as coisas passarem sem lutar para alterar a realidade, a apatia habitual de quem permite a noite cair sem acender as luzes da casa. Vê-la dançar, de longe, com a luz clara batendo somente nos seus pés me deixava encantada e certa de estar feliz. Bem se sabe que a vida é bem maior que isso, e que se agarrar a momentos belos - mas pontuais - é coisa de quem vive no mundo da lua. Certo? É óbvio que não, numa resposta ao meu próprio julgamento, carregado de todos os dedos em riste contra mim. Eu queria viver num campo calmo e cheio de flores, queria ter a mente repleta de carinho e usar a força do amor como escudo para conter as ameaças do mundo. Errei.
Ao longo da vida, fui montando uma personagem, uma figura melancólica e sofrida, à espera das decepções para reafirmar minha identidade, o que é bastante difícil de sustentar. Não é a primeira vez que desenho dores, mas elas se repetem e parecem bagunçar sempre um lado diferente da minha mente, trazendo à superfície um eu renovado.
Entre sentimentos de vergonha, culpa e arrependimento, pergunto-me, afundada na cadeira, em posição de quem vai desistir de se curar, se ela decidirá mesmo por me extirpar dos seus dias, e se não serei mais aquela a acudi-la quando alguma tristeza qualquer lhe fincar as garras. E como eu me sentia útil em fazer isso. E como o vazio parecia diminuir aos poucos quando me arrematava em seus beijos. Mas a minha cabeça insiste em girar e a dor é realmente física, posso encontrá-la aqui se for preciso…










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