O que foi, afinal, o governo Bolsonaro?
Imagem de: www.slon.pics / Freepik
Dizem que o brasileiro tem memória curta. Agora, na perspectiva de uma eleição presidencial, a falta de memória é problema sério que traz graves consequências. Para refrescar lembranças do que foi a gestão de Jair Bolsonaro, passamos a republicar - todo domingo - comentários sobre este governo.
Assim, você poderá avaliar toda a trajetória deste governo ( ou desgoverno ). Quando outubro chegar, com os fatos recolocados, você pode formar seu julgamento. E se quiser reconduzir Jair Bolsonaro ao poder, é decisão e responsabilidade sua.
Hoje é muito interessante lembrar desse texto porque - pasmem - continua super atual. O que se percebe é que o governo Bolsonaro, ao invés de governar ( que é o que deveria fazer ), perde-se no looping de temas absurdos e teses sem fundamento. Lá em maio/20 o assunto eram as fake news e o enfrentamento ao Supremo Tribunal Federal.
MALDITA HIPOCRISIA - Texto originalmente publicado em 28.05.20
A reação do Planalto às investigações dentro do inquérito das fake news envolve, como sempre, ameaças diretas à democracia.
Uma das coisas que mais me irrita é hipocrisia. Sabe como é… beato que vai na zona, ladrão que faz discurso sobre propriedade, corrupto pregando o controle das contas públicas. Coisas assim cobram uma quantia enorme da minha reserva de paciência. Por isso o sangue sobe quando vejo a familícia Bolsonaro falando em defesa da democracia e da liberdade de expressão.
Ora, por favor, parem de chamar estes blogueiros que disseminam fake news e os empresários que os financiam de gente de bem. Parem de dizer que a liberdade de expressão está sob ameaça por conta do inquérito que corre no Supremo Tribunal Federal. Vocês sabem muito bem o que estão fazendo: subvertendo a opinião pública e o próprio processo eleitoral.
Liberdade de expressão e respeito à imprensa são pilares de qualquer democracia. Liberdade de expressão, contudo, não significa impunidade de expressão. Por liberdade de expressão se entende que qualquer pessoa ( e a imprensa também, seu Jair ) pode manifestar sua opinião sem que haja censura prévia. Mas se a opinião for injuriosa, difamatória ou caluniatória, a pessoa ou o órgão de imprensa irá responder por seu atos. Para quem finge que não entende, vamos dar um exemplo bem simples usando o próprio STF: é perfeitamente possível publicar um artigo criticando o voto de um Ministro do Supremo, seja por razões técnico-jurídicas, seja por razões éticas ou morais; mas não se admite que, por conta deste voto, você xingue o Ministro com palavras de baixo calão e afirme que ele ( sic ) trabalha para a bandidagem. A liberdade de expressão garante que você publique baixarias em seu sujo blog, mas você responderá por isso.
Outro exemplo, agora na vertente fake news. Ano passado, o mesmo Eduardo Bolsonaro que vive ameaçando as instituições constituídas e agora balizou um termo para democracia, com o intuito de depreciar a imagem da ativista adolescente Greta Thunberg, editou uma fotografia em que ela aparecia comendo hambúrguer numa cabine de trem, enquanto meninos negros esquálidos e famintos contemplavam do lado de fora. A montagem, sinistramente arquitetada pelo filhinho 02, correu a internet. E era escandalosamente falsa! É possível que milhares de pessoas tenham uma péssima visão da ativista sueca por conta desta fake news.
Durante a campanha eleitoral, viralizou uma imagem em que a candidata à Vice-Presidência, Manuela Dávila, aparecia com uma camiseta com a seguinte mensagem: Jesus é travesti. Tratava-se de uma adulteração, pois na verdade a mensagem era: Rebele-se! Qual foi o prejuízo que esta fake news trouxe à imagem da candidata? Como a comunidade religiosa, evangélica, passou a considerar sua candidatura?
Nenhuma pessoa sensata acredita que a disseminação de fake news deva ser impunemente assegurada pela liberdade de expressão. A existência de um Gabinete do Ódio, coordenado por Carlos Bolsonaro - o filhinho 03 - e financiado pelos empresários que o Presidente chama de gente de bem, é assegurada por depoimentos de quem participou do governo, notadamente a deputada Joice Hasselmann. E é provada empiricamente pelo mar de fake news que assola os brasileiros diariamente, impulsionado por robôs, blogueiros inescrupulosos e empresários do mal.
Pode-se legitimamente discutir a iniciativa do inquérito ter partido da Presidência do STF. Juridicamente, a medida pode receber censuras, porque promove a confusão entre juiz e investigador. A rigor, a iniciativa caberia ao Ministério Público Federal. Contudo, a aceitação tácita do MPF, tanto por Raquel Dodge, quanto por Augusto Aras ( este a princípio, porque agora parece estar a serviço do Planalto ), acabaram por legitimar o procedimento. Aras faria melhor em encampar a iniciativa e começar a cumprir suas atribuições constitucionais, antes que outro Procurador faça valer o princípio da independência funcional e aja em seu lugar.
De qualquer modo, tendo em vista a realidade dos fatos e os danos causados à nação, identificar o inquérito das fake news como um atentado à liberdade de expressão e uma agressão à democracia só pode ter uma palavra: HIPOCRISIA.
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