A COLÔNIA POLACA SE LEVANTA EM SÃO MATEUS DO SUL: COMEÇA A REVOLUÇÃO FEDERALISTA NO PARANÁ
- Hatsuo Fukuda

- há 2 minutos
- 5 min de leitura

ANTONIO BODZIAK, LÍDER DA COLÔNIA POLACA EM SÃO MATEUS DO SUL, COMEÇA A REVOLUÇÃO FEDERALISTA NO PARANÁ, ABRINDO CAMINHO PARA O GENERAL GUMERCINDO SARAIVA TOMAR A LAPA E CURITIBA
A região da futura cidade de São Mateus de Sul fervilhava de imigrantes poloneses. No ano de 1891, chegaram às matas, às margens do Rio Iguaçu, 1.500 poloneses. Um de seus chefes – idealizador de uma Nova Polônia em terras americanas -, Antonio Bodziak, estava emocionado ao ver tantos compatriotas chegando e transformando em realidade seu sonho. As colônias de Taquaral, Canoas, Iguaçu, Cachoeira e Água Branca começavam a desbravar as matas e se transformar em lar para os pobres imigrantes que ali chegavam, através dos vapores que percorriam o Rio Iguaçu.
Antônio Bodziak e João Onofre Flizikowski montaram um comércio em parceria. Antonio e seu irmão Francisco, uma serraria para aproveitar a madeira que existia em abundância na região. A colônia fervilhava.
Os chefes oficiais da imigração, entretanto, começaram a entrar em conflito com os colonos poloneses. Estes eram muito diferentes dos colonos nativos. Em chegando, os imigrantes polacos não se satisfaziam com um simples rancho e um trempe para duas panelas e o fogo. Não. Os polacos queriam boas moradias, estradas, pontes, escolas, igrejas. Por mais pobres e humildes que fossem, seus padrões culturais, religiosos, morais e materiais estavam muito acima dos da terra em que chegaram.
O choque cultural logo se estabeleceu com os chefes da imigração, nomeados pelo Governador Vicente Machado. Plínio Miró, chefete local, em chegando, mudou o nome da colônia para Maria Augusta, nome da esposa do chefe da imigração – uma bajulação característica da oligarquia nativa -, nome que não pegou, pois os polacos continuaram a denominar o local de São Mateus, que permanece até hoje.

Antônio Bodziak encontra o monge João Maria. Conversam. Bodziak, angustiado com as dificuldades sem fim que assolavam a colônia e ele próprio, pergunta ao santo errante:
- Precisamos ressuscitar, profeta. Pode me dizer como ressuscitar?
- O senhor quer saber como ressuscitar um homem? Ou um povo?
- Há alguma diferença?
- A ressurreição de um homem passa pela morte. Mas a ressurreição de um povo passa pela fé.
Bodziak foi para Curitiba, sem uma pataca no bolso, decidido a levantar fundos para a colônia. Lá chegando, descobriu-se herdeiro de uma pequena fortuna que lhe havia sido destinada pelo Major Mathias Taborda Ribas, com quem havia trabalhado anos antes. Taborda Ribas havia falecido sem deixar descendentes, o que explica a herança deixada a Bodziak.
A fé havia salvado um homem.
Ele retornou à São Mateus, acompanhado do padre João Batista Peters, um padre polonês.
A colônia compareceu em peso à primeira missa de um padre polaco em São Mateus. Isso foi em 16 de agosto de 1891, e as famílias choravam de emoção e saudades, ao ouvir o sacerdote, falando em polonês, dizer das dificuldades que viveram na terra natal e como aquela nova terra poderia dar a eles um futuro promissor.
Em dez dias, o padre realizou 47 batizados e 36 casamentos.
A fé, reavivada, chegara para preparar o povo polaco para os sofrimentos que ainda viriam.
Plinio Miró, o chefe da colônia, embolsava os pagamentos devidos aos colonos que trabalhavam na construção das estradas. Ao mesmo tempo, sendo o único comerciante, inflacionava os preços dos mantimentos. O litro do feijão dobrou de preço em alguns meses. Os colonos passaram a dever ao pequeno tirano local, preposto de Vicente Machado.

A revolta germinava em todo o Brasil, e finalmente explodiu. Começou a Revolução Federalista. Os maragatos pegam em armas contra o governo central. Gumercindo Saraiva sai do Uruguai com 600 homens e invade o Rio Grande do Sul, em fevereiro de 1893. Joca Tavares lança um manifesto, conclamando o povo às armas:
- O Rio Grande, pátria de heróis, está convertido em terra de escravos, com os pulsos algemados e as bocas amordaçadas.
Em São Mateus, em julho de 1893, Bodziak funda a sociedade O Atirador – Kazimierz Pulaski e coloca 60 homens para treinar tiro e disciplina militar. No estatuto da sociedade, lê-se a exigência para seus membros:
- Comportamento moral e manter o espírito polonês (...) pois povo sem padres e igreja com o tempo é capaz de virar um bicho e esquecer Deus e a Pátria.

Ainda em julho, chega o padre Wladyslaw Smolucha, recebido com vários tiros de alegria. O padre tinha formação militar, o que somente Bodziaki sabia.
Em outubro de 1893, chega a São Mateus, vindo da Polônia, o professor Jan Kosminski, um homem atlético, com músculos bem delineados e um sorriso jovial. Ele tinha sido coronel do Exército Austríaco, mas havia sido expulso por suas posições pró-polonesas.
A Sociedade O Atirador – Kazimierz Pulaski já tinha 150 membros. Alberto Troczynski dava aulas de ordem militar. O alfaiate Kowalski confeccionou uniformes vermelhos e quepes cracovianos. O ferreiro Ulbrich preparava gadanhas pontudas e derretia chumbo para as balas. Anna Bodziaki assumira a direção dos negócios da família, devido aos afazeres do marido.
O exército polaco estava pronto para a revolução.
A revolta começou em São Mateus com a obrigação do alistamento compulsório decretado por Vicente Machado, e executado ditatorialmente por Plinio Miró. Polacos e brasileiros eram sequestrados e obrigados a servir na tropa. A colônia, reunida, sob a liderança de Bodziak, decidiu dar um basta à ditadura.
Bodziak dividiu os homens em três divisões. A tropa marchou, cantando Marsz Strzelkow (Marcha dos Atiradores), um hino patriótico polonês. Este hino, criado no século XIX, era cantado pelos insurgentes poloneses contra o domínio russo sobre a Polônia. Trechos do hino mostram a natureza guerreira da canção:
Ei, atiradores, juntos, a águia branca acima de nós/E à nossa frente está um inimigo mortal/Em breve nossas espingardas soarão como raios/E Deus Salvador guiará a bala/Então prepare sua arma e coloque a bala bem fundo/Afie o aço sobre o túmulo do pai/Ao som das trombetas, fique atento/Ei! Atenção, mire e atire na cabeça ou no coração!
A ação foi vitoriosa, e no dia 22 de novembro de 1893, Bodziak telegrafou para o General Piragibe, que estava em Rio Negro, comunicando a tomada da colônia de São Mateus pelas tropas revolucionárias.
A Revolução Federalista começara no Paraná. O caminho estava aberto para Gumercindo Saraiva, que a seguir, com a ajuda do Batalhão Polaco, tomaria a Lapa e Curitiba.
Mas esta é outra história.
Hatsuo Fukuda

Esta e outras histórias, minuciosamente contadas, estão no livro O Imortal Coronel Bodziak, de Gerson Cesar Souza, numa edição bilingue. Está disponível em edição Kindle por R$ 6,00, ou em formato papel por R$ 61,40, na Amazon Books. Uma pechincha. É uma história romanceada da vida de Bodziak, o que significa que é altamente legível. O autor se baseou em inúmeras fontes polonesas, normalmente ignoradas pela historiografia oficial, mostrando as razões que levaram a colônia polaca, de índole pacífica, a integrar a tropa maragata. As imagens foram retiradas do livro.

Hatsuo Fukuda é um japonês que se pergunta porque a historiografia oficial ignora o papel da comunidade polonesa na Revolução Federalista.










Comentários