A festa dionisíaca de Alvaro Collaço: Teatro de Comédia do Paraná – 60 anos
- Hatsuo Fukuda

- há 9 horas
- 4 min de leitura

O livro Teatro de Comédia do Paraná, de Alvaro Collaço, comemorativo dos sessenta anos de criação do Teatro de Comédia do Paraná, é uma festa. Uma festa em que o jornalismo se enrosca com a história, e esta com o teatro, contada pelos seus atores. E que atores. E que narrativa. Cada capítulo, dedicado às peças que foram encenadas pelo TCP, é uma ode à alegria de viver. É uma festa da memória curitibana – e brasileira -, contada com leveza e bom humor. Foi um trabalho extraordinário de pesquisa. É super bem documentado.
Beth Goulart, a grande atriz, sintetiza tudo ao dizer que o teatro é um chamado para a vida, um encontro que é uma experiência coletiva única, inesquecível e transformadora. Estas palavras se aplicam ao livro de Alvaro Collaço.
O leitor solitário, jogado no sofá, descobre-se de uma maneira ou outra participante desta experiência coletiva, inesquecível e transformadora que foi o Teatro de Comédia do Paraná.
O teatro no Paraná era amador ou semiamador, produzido por abnegados como Ary Fontoura, Odelair Rodrigues, Sinval Martins, Lala Schneider, Renê Dotti (quando estudante no Colégio Estadual do Paraná e na Faculdade de Direito) e outros, que depois seguiram carreiras artísticas, ou, como no caso de Renê Dotti, jurídica.
O Teatro Guaíra, ainda inacabado, não passava de uma casa sem alma.
Ary Fontoura ganhava alguns trocados cantando em uma das casas da Otília, notória senhora gaúcha que proporcionava prazeres ilícitos aos varões da província.
As mocinhas da cidade frequentavam os bailes e chás dançantes da Medicina e Engenharia à cata de namorados e futuros maridos.
A Cidade Universitária, como Curitiba era conhecida, vivia em quase total obscuridade cultural.
Neste ambiente de miséria artística, Ney Braga, um governador amante das artes, insuflou vida ao vetusto e inacabado Teatro Guaíra, criando o Teatro de Comédia do Paraná e o Curso Permanente de Teatro, e convidando Cláudio Correa e Castro para ser o diretor da companhia.
Alvaro Collaço, jornalista, escritor e produtor cultural curitibano, escreveu, redigiu e editou o livro. Ele se propôs a escrever um livro jornalístico, não acadêmico, e que trouxesse memórias de artistas e técnicos que lá trabalharam. E fez disso uma festa da memória. E que festa. Todos estão lá. Shakespeare, Brecht, Tchekov, Sófocles, Andersen, Dalton Trevisan, o anarquista Giovanni Rossi. E atores, atrizes, diretores, músicos, cenógrafos, maquinistas, eletricistas, contrarregras. Que equipe fabulosa.
Por alguns momentos, a festa curitibana foi uma festa brasileira, tantas as personalidades da cena nacional que aqui aportaram.
A parte gráfica do livro (um primor) é de Adalberto Camargo.
O fotógrafo José Kalkbrenner assina centenas de fotos do livro.
Ganhei meu exemplar em uma visita que fiz ao Teatro Guaíra, por motivos outros. Procurei na Amazon Books e não o achei, o que é uma falha grave. Ponha seu barco para navegar na rede, Álvaro. O Brasil precisa conhecer esta história. Não deixe os leitores dependerem da boa vontade dos governantes de plantão. Não há mais um Ney Braga na política local e nacional.
Agora só resta uma coisa a fazer: a peça. O roteiro, os personagens, as canções, a cenografia, tudo está no livro. Avante, Collaço.
Selecionei alguns trechos para os leitores do blog.
Hatsuo Fukuda
Um elefante no caos, de Millôr Fernandes
“Se eu não fosse general eu seria ator”.

A primeira peça, que estreou em 17 de abril de 1963, com direção de Cláudio Correa e Castro (depois ator global).

Conta Danillo Avelleda, que participou como contrarregra e figurante: “De vez em quando, a gente via uma pessoa lá no fundo da platéia. Aí ele subia e dizia:
“Eu vim assistir o ensaio, porque se não fosse general eu ia ser ator”.
Era Ney Braga.
Schweyk na Segunda Guerra Mundial, de Bertolt Brecht
“Lala Schneider ganha o papel e diz para a sobrinha: “Viu como eu sou danada?”

Estreou em 6 de novembro de 1967, em plena ditadura militar. A peça foi pela primeira vez encenada no Brasil. Claudio Correa e Castro dirigiu e também fez os cenários. Ileana Kwasinski foi a autora dos figurinos.


Lala Schneider interpretou o papel de uma dona de bar, mas a personagem precisava cantar, e Lala nunca havia cantado em público. Ela disse para a sobrinha, Esmeralda Silveira:
“Viu como eu sou danada!” Mostrou porque é considerada a Grande Dama do Teatro Paranaense.
Terra de Todas as Gentes, de Adherbal Fortes Jr e Paulo Vítola

Inaugurou o grande auditório, o Guairão, em 12 de dezembro de 1974. Um espetáculo grandioso, com 300 artistas envolvidos. A peça foi inspirada no filme Sete Noivas para Sete Irmãos, de Stanley Donen. “O espetáculo foi muito bonito, com música maravilhosa, mas simples. Era uma festa da comunidade, de todas as gentes, para comemorarem a inauguração do grande teatro do Paraná”, disse o ator José Plínio.

Hatsuo Fukuda assistiu a algumas das peças do TCP, e só agora se deu conta que participara de uma das grandes festas do teatro brasileiro.










Comentários