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Como vai, López, uma crônica de Julio Cortázar

Julio Cortázar, escritor argentino, morto em 1984, está mais vivo do que nunca, como provam os livros O Jogo da Amarelinha e Histórias de Cronópios e de Famas

Júlio Cortázar, um escritor hoje quase esquecido, mas que continua bem vivo. Esta crônica faz parte de Histórias de Cronópios e de Famas, tradução de Glória Rodriguez, edição da Civilização Brasileira. No mundo de aparências das redes sociais, Cortázar continua atualíssimo. A Companhia das Letras reeditou O Jogo da Amarelinha e outros livros dele. (Redação)


Como vai, López

Uma crônica de Julio Cortázar


Um senhor encontra um amigo e o cumprimenta, estendendo-lhe a mão e inclinando um pouco a cabeça.


Isto é, acha que o cumprimenta, mas o cumprimento já foi inventado e este bom homem não faz mais do que repeti-lo.


Chove. Um senhor se refugia debaixo de uma arcada. Esses senhores quase nunca sabem que acabam de escorregar por um tobogã pré-fabricado desde a primeira chuva e desde a primeira arcada. Um úmido tobogã de folhas murchas.


E os gestos de amor, esse doce museu, essa galeria de figuras de fumaça. Console-se a sua vaidade: a mão de Antônio procurou o que sua mão procura, e nem aquela nem a sua procuravam nada que já não tivesse sido encontrado desde a eternidade. Mas as coisas invisíveis precisam encarnar-se, as idéias caem no chão como pombas mortas.


O verdadeiramente novo assusta ou deslumbra. Essas tuas sensações, igualmente perto do estômago, acompanham sempre a presença de Prometea; o resto é o conforto, o que sempre sai mais ou menos bem; os verbos ativos contêm o repertório completo.


Hamlet não duvida: procura a solução autêntica e não as portas da casa ou os caminhos já percorridos por mais atalhos e encruzilhadas que eles proponham. Quer a tangente que destrói o mistério, a quinta folha do trevo. Entre sim e não, que infinita rosa dos ventos. Os príncipes da Dinamarca, esses falcões que preferem morrer de fome a comer carne morta.


Quando os sapatos apertam, é bom sinal. Alguma coisa muda aí, alguma coisa que nos mostra, que surdamente nos põe, nos suscita. Por isso é que os monstros são populares e os jornais se extasiam com os bezerros bicéfalos. Que oportunidade, que esboço de grande salto para a outra coisa!


Lopes vem chegando


- Como vai, Lopes?


- Como vai, cara?


E é assim como eles acham que estão se cumprimentando.


Histórias de Cronópios e Famas, livro de Julio Cortazar continua atual

Histórias de Cronópios e de Famas encontra-se à venda na Amazon Books, Estante Virtual, Mercado Livre e em todas as boas casas do ramo. Se você não leu, leia. Não vai se arrepender.

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