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Foto do escritorHatsuo Fukuda

JABUTICABAS


Agricultura tropical, uma jabuticaba brasileira que deu certo.


Imagem de Brasil Journal

Um dos truísmos na vida brasileira é dizer que se não é jabuticaba e só tem no Brasil, então não presta. O Brasil exausto de tantas decepções adotou o lema. Quando tudo vai mal, culpa-se o país, incapaz de prover soluções para os seus problemas. “É uma jabuticaba brasileira. Não vai dar certo.” Normalmente, não dá certo, pois as soluções aventadas quase sempre nada tem a ver com os problemas que supostamente deveriam resolver. Isso se repete em quase todos os campos, na saúde, na educação, na política, na economia. Para mim, esta visão pessimista do Brasil repete, às avessas, o anacrônico pensamento abraçado pelas nossas atrasadas oligarquias, que embriagadas pela sua ignorância, exaltavam o Brasil como um país sem igual, pelo seu tamanho, suas riquezas minerais, suas florestas, sua ausência de terremotos e tufões. Até a resignação estóica dos negros era exaltada.


A extensão territorial? O maior matagal do mundo. Suas riquezas minerais? Debaixo da terra, ignoradas e inexploradas. Suas florestas? Um inferno verde. Ausência de terremotos e calamidades? Eles não conheciam o país, não tinham serviço de meteorologia. E quanto à negrada, desde que fique na favela, merece nossa gratidão. E dá-lhe Jeca Tatu. Quem formulou este pensamento, e se tornou um clássico da ignorância, Conde de Affonso Celso, em um livrinho hoje esquecido, Porque me ufano do meus país, não estava sozinho. O livrinho, escrito por ocasião do IV Centenário do Descobrimento, cita, bem a propósito, Gonçalves Dias:


Nosso céu tem mais estrelas/ Nossas várzeas têm mais flores/Nossos bosques têm mais vida/Nossa vida mais amores”.


Estes versinhos, nos antigos grupos escolares (aliás, frequentados por pouquíssima gente), eram decorados pelas criancinhas, junto com o malfadado livrinho de Affonso Celso.


E, no entanto, há jabuticabas e jabuticabas.


Uma delas, tratorando, por assim dizer, o ufanismo nativo, foi a agricultura tropical. Foi inventada no Brasil. Uma jabuticaba brasileira. Começou por fazer que o ufanista país que importava alimentos para a sua população, se transformasse em uma potência agrícola. O país, que produzia 38 milhões de toneladas de alimentos em 1975, passou a produzir mais de 300 milhões em 2023. Nada de exaltar os infindos campos, tapizados de macia e fresca relva, constelados de flores selvagens. Essa verborragia ufanista escondia as mazelas do país e de sua agricultura e a miséria social e cultural.


Foi um trabalho lento e persistente. Investimentos em ciência, tecnologia e educação foram necessários durante estes anos, conjugando esforços de agricultores e do Estado. Deu certo. Certa vez, conversando com um engenheiro agrônomo da Emater, ele me mostrou uma foto antiga, em preto e branco, de um grupo fundando a Coamo. Era um punhado de homens e mulheres, e o agrônomo ali estava, assessorando os novos empreendedores, enviado pela Emater. Hoje a Coamo é uma das maiores empresas do Brasil – a maior cooperativa da América, segundo dizem. Impossível pensar no Paraná e no Brasil sem estas cooperativas.


Embora o produto final – a agricultura tropical, particularmente no Cerrado – seja uma invenção nativa, a engenhosidade da política não é. Ciência, tecnologia, educação, foi uma fórmula adotada por todos os países, com sucesso. Os irmãos do Norte são o exemplo mais próximo, mas Japão, China, Coréia do Sul são os exemplos mais recentes.


Nosso programa modernizador, com ênfase na ciência, tecnologia e educação no campo, criou a jabuticaba brasileira, a agricultura tropical, que hoje é responsável por exportar produtos para mais de duzentos países do mundo, produziu uma verdadeira revolução no país, não apenas econômica. O deslocamento do eixo da economia brasileira, da indústria para a agricultura, se refletiu na pujança econômica de Estados outrora periféricos.


Esta revolução teve vários pais, mas um entre eles se destaca: Alysson.


Gosto de pensar nele como Alysson. Não o Dr. Paolinelli, nem o ministro, nem deputado; nada dos salamaleques com que se tratam as otoridades no país; Alysson, como um velho amigo, que nos ajudou quando mais precisávamos, inscientes da nossa precisão. Quando foi Ministro da Agricultura, lá nos anos 70, mandou mais de dois mil pesquisadores para o exterior, para aprender novas técnicas em centros avançados. Fortaleceu a Embrapa, o que gerou um efeito cascata nos Estados. Hoje é o contrário. Pesquisadores do mundo inteiro vêm ao Brasil aprender como se faz. Investimentos em ciência, tecnologia e educação. Isso produziu o milagre das duas safras por ano, a caminho do novo milagre, a terceira safra anual. Quando você comer um frango frito, ou mastigar um pãozinho, pense nele. Foi o responsável pela comida na sua mesa. Quando morreu, estava trabalhando na integração da lavoura, pecuária e floresta. Aos oitenta e cinco anos. Foi indicado duas vezes para o Prêmio Nobel da Paz e ganhou o World Food Prize ( uma espécie de Nobel da Alimentação).


Pensando nele, às vezes, acho que o Brasil tem jeito. Obrigado, Alysson.

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