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Foto do escritorHatsuo Fukuda

CACHORRADAS

Amor, fidelidade, honra, amizade; só entre cachorros. Ou não?


Leio nos jornais que o ex-ministro teria feito uma cachorrada ao presidente; ou, talvez, o presidente teria feito algumas cachorradas ao ministro, que, por sua vez revidou, à maneira canina. Como não sou um sabujo, meu faro prejudicado por anos e anos de álcool, tabaco e leituras vadias, costumo me perder nos detalhes, digamos assim, cachorrísticos. Então, vou deixar a questão que prende dia e noite os comentaristas da Globonews para lá, e vou falar sobre o que realmente interessa, ou seja, os cachorros bons (com todo respeito aos demais).

No blog Bom pra Cachorro, da Lívia Marra, que você encontra no site da Folha de São Paulo, fico sabendo que “Cachorro se recusa a deixar corpo de amiga morta em estrada”, acompanhada de uma foto em que um cão, sentado à beira de uma estrada, vela por uma amiga morta. Isso teria acontecido em Kingsville, no Texas. Felizmente a turma de amigos dos cães já chegou e tirou o melhor amigo daquela triste situação. Se a amiga não pôde ser trazida à vida, pelo menos o cão foi levado a um abrigo e está sendo tratado com carinho. História semelhante aconteceu em Wuhan, na China, com uma vítima da pandemia e seu fiel amigo, Xiaobao.


Essas notícias, que são recentes, nos trazem à memória talvez o mais famoso destes fiéis amigos do homem, Hachiko, que costumava acompanhar o seu dono, Hidesaburo Ueno, professor da Universidade Imperial de Tokio, até a estação de trem, todos os dias, e encontrá-lo no seu retorno, no final da tarde. Certo dia, o professor Ueno teve uma hemorragia cerebral em seu trabalho. Desde esse dia, até a sua morte, por dez anos, Hachiko retornaria à Estação para aguardar o retorno de seu mestre.


No Japão, Hachiko foi elevado à categoria de herói nacional, como símbolo de fidelidade. Crianças aprendem nas escolas a importância da lealdade e Hachiko é citado como exemplo. Uma estátua foi erguida na Estação Shibuya, onde ele continua aguardando seu amigo. Quando você for a Tokio, faça como milhares de turistas e dê uma passada lá: é um dos pontos mais visitados.


O cinema naturalmente não deixaria passar essa. Um filme japonês foi feito (não assisti), contando a história. Hollywood fez um remake, Sempre ao seu lado, com Richard Gere e Joan Allen, direção de Lasse Hallstron. Já me antecipei contando o final, portanto, não vou cometer nenhum crime em dizer que você deve se preparar com caixas e caixas de lenços de papel, ou os antiquados lenços de pano; preparem vários. É de chorar lágrimas de esguicho, como dizia o velho jornalista. É ótimo.


Na GooglePlay há também a última versão cinematográfica do sempre clássico O Chamado da Floresta, de Jack London, desta vez com Harrison Ford. O personagem principal, Buck, um mix de São Bernardo com Collie escocês, foi feito em computação gráfica (CGI, para os íntimos), assim como todos os demais animais do filme. Realmente, Buck parece humano, demasiado humano, em certas cenas, o que é motivo de aborrecimento para alguns críticos; nós que estamos no sofá disputando a pipoca com a piazada, não damos bola para isso. Que venha o CGI; para nós, Buck, em toda a sua fofura digital, é mais real que todos os cachorros que circulam por aí, travestidos de humanos sérios. Todos os que convivem com cães sabem que eles se comunicam conosco melhor do que a maioria dos humanos se comunica entre si; tenho, no meu dia-a-dia, meu amigo Chico como prova. O diálogo entre cães e humanos é um fato conhecido por todos; no filme, a fácil comunicação pode-se considerar como uma licença poética.


Um amante canino, politicamente correto, vai contestar o meu uso da palavra “cachorrada” para adjetivar a celeuma brasiliense (realmente, um insulto à dignidade canina); antecipo os críticos lembrando do Buck que inspirou o filme. Jack London descreve em detalhes a viagem épica do herói às suas origens lupinas. No fundo de sua fofice há o DNA de um animal selvagem: sua coragem alia-se à matreira habilidade de enganar os seus inimigos, o importante é sobreviver; esta é a lei da selva. No mundo pré-contratual descrito por Hobbes (o homem é o lobo do homem) em que se transformou a política nacional, cachorradas, em seu sentido mais dark, são a expressão perfeita do que estamos assistindo em rede nacional, ao vivo. Sem glamour.

O Chamado da Floresta você pode assistir no GooglePlay. Estrelando, Harrison Ford e o cão Buck, dirigido por Chris Sanders. Sempre ao seu lado, com Richard Gere e Joan Allen, encontrei na Internet. Ambos dublados. Depois que você colocar as crianças na cama, faça um favor a si mesmo e vá assistir os filmes de Lasse Hallströn. Minha vida de cachorro (filme sueco, indicado ao Oscar de melhor direção e roteiro adaptado), Chocolate (Juliette Binoche, Johnny Depp e um elenco estelar), Regras da Vida (Tobey Maguire, Michael Caine e a grande atriz Charlize Theron em plena juventude). Regras da Vida foi indicado a 7 Oscars, ganhando dois: melhor ator coadjuvante para Michael Caine, e melhor roteiro adaptado. Casanova, com Heath Ledger, é um ótimo Casanova, uma fantasia – como se não bastasse a aventureira vida do próprio. Por último, se você não leu, não deixe de ler O Chamado da Selva, de Jack London. Se leu, faça como eu, leia de novo.

1 Comment


Camila Fukuda
Camila Fukuda
Jun 09, 2020

Irei assistir as recomendações e acrescento Marley e eu! Também é emocionante.

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