CELSO NASCIMENTO, LENDA DO JORNALISMO PARANAENSE, CONTA SUA TRAJETÓRIA: DE GUTEMBERG A ZUCKERBERG
- Redação

- 3 de set.
- 6 min de leitura

O jornalista Celso Nascimento, ao se definir, diz: “Em primeiro lugar, sou jornalista”. A autodefinição é precisa, jornalística, para todos que o conhecem, que sabem que sua vida se confunde com a história do jornalismo paranaense desde os anos 60.
Embora retirado da lida diária da imprensa, Celso Nascimento, como todo intelectual, não abandonou a vida do pensamento e da comunicação, mantendo-se como observador perspicaz dos acontecimentos do Brasil e do mundo, que comunica aos amigos através das redes sociais, enquanto se dedica a escrever um livro de memórias.
Aguardamos ansiosamente o livro.
Enquanto isso, assista o vídeo da entrevista que ele deu ao jornalista Luiz Renato Ribas, no site Memórias Paraná onde ele conta um pouco de sua trajetória.
Não perca, amanhã, um artigo inédito de Celso Nascimento, especial para o Dialéticos: O dia em que Oscar Niemeyer quebrou meu gravador.
(Da Redação)
Abaixo, trechos da entrevista, que foram resumidos, para maior clareza.
Em primeiro lugar, sou Jornalista.
Meu pai veio do Ceará em 1915, fugindo da seca, e veio parar no Paraná em 1918/20, um homem muito devoto à leitura, que lia pelo menos um livro por semana, e assinava muitos jornais. Eu era encarregado de buscar os jornais no Correio. Foi aí que tomei gosto por jornais.
Eu era um menino franzino e sofria o que hoje chamam de bullying. Eu era o menorzinho da sala, massacrado pelos maiores. Como eu não tinha força física para enfrentá-los, eu escrevia jornais de classe, e falava dos colegas, dos professores, e ganhei o respeito dos colegas.
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Lendo o jornal Estado do Paraná, soube que a UFPR havia aberto o curso de jornalismo, em 1964. Meu pai queria que eu fosse médico, mas fiz o vestibular de jornalismo e passei, por acaso, em segundo lugar.
Meu amigo Walter Schmit, que estava estagiando na Gazeta do Povo, me levou até lá e eu comecei um estágio lá, em outubro 1966, no último ano da faculdade. Desde esta época nunca mais perdi contato com a empresa.
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Tenho meio século de Gazeta e RPC, com um intervalo em que trabalhei no serviço público. Tenho uma saudade imensa de Francisco Cunha Pereira Filho. Quando eu ingressei, fazia três anos que ele havia comprado o jornal, com outros sócios. Ele estava modernizando, contratando rotativas e pessoal. Éramos muito poucos na Redação, que ele frequentava com muita assiduidade.

Volta e meia ele me convocava para algumas missões especiais. Após três anos como repórter, ele me fez chefe de reportagem, até 1975, quando fui convidado para ser assessor de imprensa da Secretaria de Agricultura, no governo Jayme Canet, e depois fui assessorar o Belmiro Jobim Valverde Castor, na Secretaria de Planejamento no Governo José Richa, em 1984.
O Dr. Francisco fiquei sabendo que eu estava desempregado e me chamou para ser chefe de reportagem do Canal 12, onde fiquei até 1995, quando ele me chamou para ser editorialista do Gazeta de Povo. Em 2001 fui chefe de redação, até 2006, quando era colunista político o Fabio Campana. O Fabio saiu e era ano de eleição e o jornal me propôs ser colunista político provisoriamente, por três ou quatro meses até o final das eleições. A coluna fez sucesso e eu permaneci como colunista político até hoje (2016). Ainda faço editoriais do jornal. Basicamente esta é minha história profissional, quase meio século de atividade.
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Em 1968, o Dr. Francisco percebeu a necessidade de ter parceria em televisão e fez um acordo com o Nagib Chede, dono do Canal 12, e eu fui um dos três jornalistas do jornal noturno, que passava à 10 horas. Eu fiquei trabalhando durante o dia na Gazeta e a noite eu ia para a tevê. Éramos eu, o Rafael de Lala e o José Dionísio Rodrigues (hoje da Opus Propaganda).
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O Canal 12 se filiou à Rede Globo e em 1.º de setembro 1969 foi lançado o Jornal Nacional. Nós íamos participar da primeira edição. Os editores, Alice Maria e Armando Nogueira, sugeriram que a matéria fosse sobre trânsito. Curitiba era a capital com maior número de acidentes de trânsito. Era considerada a capital nacional da barbeiragem. Eu fui o repórter inaugural do Jornal Nacional.
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Logo o Dr. Francisco me chamou para reativar o Diário da Tarde, para fazer concorrência com a Tribuna do Paraná. Seria um jornal mais voltado para esporte e polícia. Fui ser o editor chefe. Eu estive no Jornal da Tarde, de São Paulo, e voltei com um projeto, com edições as segundas-feiras. Trabalhavam conosco o Airton Cordeiro, que cuidava do esporte, o Daitschman, cobrindo o futebol amador, o Fabio Campana, o Benedito Pires, o Raul Varassim, o Toninho Vaz, o Walter Schimit, Jose Dionisio Rodrigues. Uma equipe pequena, mas de altíssima qualidade profissional.
O Maurício Tavora fez uma campanha: Diário do Tarde, o jornal que diz o que e o porquê. Era um jornal diferente do que se fazia na época. Tiramos a liderança do Tribuna do Paraná nas segundas-feiras. Os banqueiros faziam fila na praça para retirar jornais. Houve um dia que tivemos que chamar os gráficos para rodar uma nova edição. Este é um dos episódios que mais me orgulho na minha vida profissional.
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Eu trabalhava na Gazeta e no Diário da Tarde. Recebi uma proposta para trabalhar no governo e fui ser assessor de imprensa na Sec. Agricultura, com o secretários Paulo Carneiro Ribeiro (no Governo Jayme Canet) e com o Reinhold Stephanes, no governo Ney Braga. E com Belmiro Valverde Jobim Castor no Planejamento no governo José Richa.

Viajei muito pelo Paraná. Lembro que Paraná tinha 288 municípios. Eu fui a 250. Conheci muito a agricultura, política agrícola, o drama do produtor rural. Vi de perto, junto com o governador Jayme Canet, as consequências da geada negra, que dizimou a cafeicultura do Estado, em julho de 1975, e a economia do Paraná foi dizimada. Graças a coragem dele, o poder de liderança, e o Paraná se recuperou.
Assessorando Belmiro, no governo Richa, meu preparo dentro do governo se ampliou. Belmiro reuniu as secretarias e empresas estatais e produziu o plano de governo Richa. Eu sempre estava presente, junto com o Judas Tadeu Grassi Mendes, presidente do Ipardes. Fomos encarregados de redigir o plano de ação. Isso me ajudou a ter uma noção geral e particularizada do Paraná.
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Em razão dessa experiência profissional, desde o ginásio e nas redações de jornal e televisão, viajando bastante, tudo isso foi me dando condições profissionais. Por isso, quando me foi oferecida a coluna política do jornal, eu tentei inaugurar uma outra visão do que é política. Não é somente disputar eleições. Política é sobretudo pensar em políticas públicas, é pensar o bem comum.
Os astros ajudaram e a coluna teve uma boa repercussão. Acho que eu inaugurei um outro jeito de noticiar a política, um outro jeito de observar as coisas da administração pública, de investigar as situações, de me mostrar independente com relação aos partidos e governantes. E a coluna passou a ter um bom índice de leitura, onde permaneço até agora (a entrevista é de 2016).
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Foram dezenas de ações judiciais em razão de matérias que escrevi. Nunca houve condenação. Todas foram afastadas. Eu continuo fazendo meu papel. No Governo Requião, o Eduardo Requião, superintendente do Porto de Paranaguá, entrou com um pedido de indenização de 2 bilhões de reais. Dois bilhões de reais. Não deu em nada, claro.
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Fiz do jornalismo o meu meio de vida, nunca exerci outra profissão nestes 50 anos. Não fui vendedor de carros, picareta, curandeiro, vendedor do Bau da Felicidade. Sempre, sempre, fazendo jornalismo com maior seriedade possível. Errando muitas vezes, fazendo besteira, mas também acertando, e fazendo muitos amigos. Eu exerci muitas funções de chefia, e meus subordinados hoje são meus amigos e irmãos.
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Eu entrei na profissão em 1966 e a Gazeta do Povo recebia as notícias nacionais e internacionais da seguinte forma: embaixo de uma escada havia duas máquinas de escrever e dois soldados da PM sentados, telegrafistas contratados, pegavam sinais de código Morse que vinham pelo rádio das agências, e datilografavam as notícias que chegavam. É inimaginável para os jornalistas de hoje em dia. Em pleno século XX, usávamos rádio e código Morse.
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A redação fedia a chumbo. Havia caldeiras que derretiam o chumbo nas oficinas do jornal, que a seguir era usado para compor os tipos. Hoje é tudo computador, limpo, silencioso, não há mais as brincadeiras, chacotas, que existiam na redação. Um amigo diz que eu vivi de Gutemberg a Zuckemberg. Do inventor da imprensa ao criador do Facebook. Eu passei por todas estas fases.
Não perca, amanhã, um artigo inédito de Celso Nascimento, especial para o Dialéticos: O dia em que Oscar Niemeyer quebrou meu gravador.










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