A sorte do candidato dos três erres
- CELSO NASCIMENTO
- há 2 minutos
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A vidente enigmática profetizou: vencerá a eleição o candidato cujo nome tem três Rs

Reza o folclore político de Curitiba que, às vésperas da eleição municipal de 1954, o vereador Myltho Anselmo da Silva — figura popular e de fala com algum sotaque caipira — andava animado com a possibilidade de disputar a prefeitura.
Como bom supersticioso, decidiu consultar uma sortista para saber de antemão se teria chances de vitória. A vidente, depois de mexer suas cartas e fechar os
olhos por um instante, deu uma sentença enigmática:
— O próximo prefeito de Curitiba será um homem cujo nome tem três erres.
Myltho arregalou os olhos, fez as contas rapidamente e, tomado de entusiasmo,
exclamou com seu jeito característico:
— Sou eu mesmo, dona! MiRto AnseRmo da SiRva!
Mas a profecia da sortista se cumpriu de outro modo. O eleito, naquele 1954, foi Ney Amintas de BaRRos BRaga — ele sim, o candidato com três “R” no nome.
E assim, entre o humor e a ingenuidade, a história atravessou as décadas, ganhando o estatuto de uma divertida passagem do folclore político curitibano — lembrança de um tempo em que a política ainda comportava pitadas de graça, superstição e humanidade.
As eleições municipais de 1954 marcaram um dos períodos mais movimentados da política curitibana do pós-guerra. O país vivia o segundo governo Vargas, e os partidos tradicionais — PSD, PTB, UDN, PSP e PL — disputavam acirradamente o controle do cenário local.

Em Curitiba, concorreram à prefeitura nomes de peso: Ney Amintas de Barros Braga (PSP), que sairia vitorioso e depois se tornaria governador e ministro; Wallace Tadeu de Mello e Silva (PST, médico psiquiatra pai de Roberto Requião); Alfredo Pinheiro Júnior (PSD); Estevam Ribeiro de Souza Neto (PTB); Amâncio Moro (PL); João Cid Macedo Portugal (PDC); Roberto Barroso (PTN); e Manoel de Freitas Aranha (UDN).

O vereador Myltho Anselmo da Silva -- cabo eleitoral e faz-tudo do ex-deputado Erondy Silvério, “dono” do transporte coletivo de Curitiba -- era uma das figuras mais conhecidas da Câmara Municipal. Chegou a ser cogitado pelo PTB como pré-candidato, mas acabou preterido na convenção partidária — o que deu origem à anedota que a tradição oral perpetuou mesmo após sua morte em 1980.
A vitória de Ney Braga representou o início de uma nova fase política no Paraná, marcada pela ascensão de lideranças jovens e pela modernização do discurso administrativo. Já a história do “candidato dos três erres” permanece como ingênua lembrança dos bastidores da política curitibana dos anos 1950.
(Celso Nascimento, jornalista)

Celso Nascimento, um jovem jornalista que está iniciando na profissão, faz uns bicos para o dialeticos.com, em troca de uns martelinhos de cachaça, sem metanol.
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